Desertos, Poesia (in)cena
“A personagem é como um camafeu!”
Estávamos entre a plateia seleta do espetáculo Desertos. A atriz Flávia Teixeira iniciou a apresentação na escadaria que fica nos fundos do teatro e que dá acesso imediato ao palco onde somente 60 assentos estavam disponíveis. Ficamos no palco, junto à personagem, para adentramos na poesia íntima e visceral de Micheliny Verunschk, poeta pernambucana escolhida para construção da dramaturgia de Desertos.
Geografia íntima do deserto
Micheliny Verunschk
Micheliny Verunschk
I - O corpo amoroso do deserto
Teu corpo
branco e morno
(que eu deveria dizer sereno)
é para mim suave e doloroso
como as areias cortantes
dos desertos.
Que importa
que ignores minha sede
se tua miragem
é água cristalina?
E a miragem
eu firo com mil línguas
e cada uma
é um pássaro a bebê-la.
Ferroam minha pele
escorpiões de sol
com seu veneno
e vejo,
magoada de desejo
os grãos tão leves
indo embora ao vento.
II - A presença dolorosa do deserto
Teu nome
é meu deserto
e posso senti-lo
incrustado
no meu próprio
território
como uma pérola
ou um gesto no vazio
como o amargo azul
e tudo quanto
há de ilusório.
Teu nome
é meu deserto
e ele é tão vasto,
seus dentes tão agudos,
seus sóis raivosos
e suas letras
(setas de ouro e prata
dos meus lábios)
são meu terço
de mistérios dolorosos.
Teu nome
é meu deserto
e posso senti-lo
incrustado
no meu próprio
território
como uma pérola
ou um gesto no vazio
como o amargo azul
e tudo quanto
há de ilusório.
Teu nome
é meu deserto
e ele é tão vasto,
seus dentes tão agudos,
seus sóis raivosos
e suas letras
(setas de ouro e prata
dos meus lábios)
são meu terço
de mistérios dolorosos.
“Inspirada na palavra da Poeta Micheliny Verunschk a encenação de Desertos aponta para o poder da poesia de instaurar outra realidade por meio da linguagem. Rica em contrastes, a encenação se apóia em poemas escolhidos ao longo “O Observador e o Nada”. Do conflito entre a aparência e essência, surge em cena um indivíduo inventário de belas imagens tramadas com rigor e sensibilidade”.
Cavo o real
Herbert Emanuel
Cavo o real, amada
- não o da imediata procura
mas o que é asa e voo, metal
dos sonhos, limbo, tecedura
Cavo o real, amada
neste julho em que as luzes
e os círculos (ciclos) do amor
se renovaram.
Cavo o real, amada
os signos invisíveis
as rosas de Blake
cravadas no ar
e nos silêncios
(brancos)
da urdidura.
Cavo o real, amada
os anjos sob a sombra
as sobras da loucura
a res não cogitandus
mais do que sentido:
vária, pura, impura.
Cavo o real, e o que procuro
não é sua verdade
mas sua doçura: sua mentira
necessária.
Que Rara beleza!
ResponderExcluirEla é mesmo muito bonita. suave
ResponderExcluirCaramba o blog ta muito maneiro, ''A presença dolorosa do deserto'' ta meio que incrível esse, parabéns ao autor [:
ResponderExcluirObrigado, Rafa! Pela visita e pelo incentivo - é sempre importante.
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