cidade à contraluz
herbert emanuel e jiddu saldanha
I
entre o branco e o cinza
a porosidade do azul
rasga esta cidade
tardes são pinceladas...
manhãs nem tanto
é que a íris se refaz
da escuridão vivida
do marasmo escondido
sob a solidão
mas a ferrugem do crepúsculo
"pátina do tempo"
protege os corpos da queda
olhos glaucosverdes miram-se
em espelhos:aqui
o que se vê é o que se crê
muralhas verdes
valsas disfarçadas de rock
vibrações acrílicas
explosões de pingos d'água
um arqueiro mirando
o centro do arco-íris
as teias de aranha
muito frias, muito brancas
muito tênues
a cidade recolhe suas sombras
a luz ganha cor
vitrines são vedetes
coisificadas de desejo
de amor e morte
em núpcias imperceptíveis
tons de penura nas retinas
ora iluminadas
por um sol postiço de agosto
sombras e rostos
que o artista apenas
percorre a pincel
II
a que se abre esta cidade?
aços? cartilagens?
bofes sulfurentos?
espigas? fuligem?
rotas ou fugas aleatórias?
submundo
tecido vulcânico
lavas sacudindo o breu
ancas intumescidas...
esta cidade se abre
também aos corpos
vibráteis da alegria
outras frequências
do amor e do desejo
mestiças cartografias
música para os olhos
cores para ouvidos atentos
alentos para o desespero
nesta cidade flui
o gozo das marionetes
o vermelho do medo
e ainda por ela
passa a retórica, os excrementos
o fluxo das baratas
um caminho sem trégua
para o aleatório
esse caos de tons lúgubres
talvez o voo de mariposas
e o estardalhaço dos grilos
os ossos de sépia do poeta
nos tragam um céu pleno
um sol sem conceitos
horas de perplexidade
ou, quem sabe, apenas
amores reclusos, imobilidades
prestes a explodir
nesta cidade
um tubo voraz, a cloaca
se incha de conteúdos
e ela, a mais bela
é apenas sorriso branco
o contraste, a inocência?
a cidade se abre
a toda cumplicidade
que nunca termina
e seus múltiplos reflexos
de tons cambiantes
serão sempre...um recomeço
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